sexta-feira, 25 de março de 2011

Insetos


Fomos ver uma interessante exposição no fantástico museu da Fundação Iberê Camargo, às margens do rio Guaíba, que por si só vale uma visita. É uma mostra da artista de origem gaúcha Regina Silveira. O que me tocou particularmente é a sala dedicada aos insetos.
Mergulhei no meu mundo infantil quando passava a maior parte do meu tempo livre envolvido com estes primos distantes.

 
Caçava borboletas no jardim sempre florido de minha mãe. Com uma linha fina, surrupiada de sua costuras, amarrava no abdomem das borboletas maiores e as levava para passear como cachorros aéreos.


 
De baixo das copas de uma linha de abacateiros gigantes, tudo é enorme quando se é pequeno, organizava uma fazenda com vaquinhas de abacates verdes de diversos tamanhos, pregos e galhos faziam as vezes de pernas. Na fazenda não poderia faltar um poço com água, que resolvia enterrando uma lata de nescau e sobre ela, com auxilio de duas forquilhas instalava uma manivela, com um baldinho pendurado em um barbante. A instalação ficava invariavelmente próxima a um ninho de formigas carnívoras, que faziam uns buracos entrando no solo, completamente polidos que lembravam as formas curvilíneas das orelhas.. Ao lado fazia uma jaula circular com estaquinhas de madeira. Ali colocava borboletas desasadas ou lagartas. As formigas passavam horas transportando as vítimas arrastando-as sobre o cercado até a entrada da toca, quando o inseto era grande demais era troçado na entrada da toca. Lembro que ao lado do ninho havia um depósito  multi colorido com os restos de insetos devorados, asas de borboletas e de escaravelhos coloridos.


 
No Natal enchia vidros de compota com vaga lumes e saia vagando feito zumbi pelas noites do sítio.
Outra vez cismei em fazer uma gaiola para hospedar grilos cantores em cima de minha escrivaninha, passei semanas fatiando e amarrando ripas de taquara. Catei uns grilos de baixo de algumas pedras. Nas gaiolas eles eram bem alimentados com folhas da horta. Cantavam a noite toda. Até que roeram as fibras duras do bambu e se foram para dentro do guarda-roupa. Foi difícil acha-los, imagine o que fizeram com as fibras molinhas de minha roupas.
Esta exposição é meio amedrontadora, do tipo vingança dos insetos...




Sobre uma série de quadros do Iberê uma frase pintada ao longo da parede :

“Sou um andante. Carrego comigo o fardo do meu passado. Minhas bagagens são os meus sonhos.
Como meus ciclistas, cruzo desertos e busco horizontes que recuam e se apagam nas brumas da incerteza. Realidade e miragem se confundem. Os quadros que pinto são visões que breve serão os fósseis semeados à margem de meu rastro”.
Iberê Camargo.

sábado, 12 de março de 2011

Surpresa no verão




Como todo ano, fomos passar alguns dias na casa da minha mãe em Santa Rosa, fugindo do calor opressivo de Porto Alegre do tipo panela de pressão. Em Santa Rosa, apesar de quente, não é tão úmido e sempre corre uma pequena brisa trazendo o frescor das sombras. Em teto de zinco, a chuva é uma delícia, chama o sossego e faz brotar nos ossos a preguiça dos anos, tomara que não acabe nunca o aroma vivo da terra molhada.



Num daqueles dias resolvemos ir a um balneário às margens do rio Santa Rosa, de água rasa, fresca e um fundo de seixos rolados. Uma ótima opção para passar a tarde ou acampar. Chovera no dia anterior, a água estava barrenta e um pouco alta atrapalhando nossos planos de banho. No acesso ao rio, ao lado uma árvore, minha filha Laura a viu primeiro, uma enorme e mal dormida jararaca disposta a tudo naquele dia. De tocaia, “Hoje mato alguém”. Estávamos em cinco pessoas mirando a cobra. Por sorte não veio nenhum dos que estavam acampados ou da lanchonete. Que fazer?






  
Organizamos rapidamente um julgamento sumário do tipo tribunal de guerra. Duas correntes prevaleciam, meu irmão e minha sobrinha queriam conduzi-la direto para o inferno a porretadas, já que ele fora mordido por uma delas quando tinha 6 anos (acho que foi por castigo divino, toda família estava indo ao culto dominical e ele resolveu ficar brincando no potreiro da casa da minha tia, correndo pelos caminhos deixados pelas vacas, quando foi picado por uma jararaca). Além disso, meu irmão temia pelas crianças acampadas. A segunda corrente de argumentos consistia em que ali era o habitat natural da cobra e nós eramos os invasores. A cobra também é uma grande predadora de ratos, que também são vetores de muitas doenças, e que provocam mais mortes que as picadas de cobras. Por impossibilidade natural, a opinião da cobra não foi levada em conta. O argumento decisivo foi o reconhecimento que apesar de sua picada ser letal, os homens são muito mais mortíferos entre si do que esses pobres animais.
Nunca vi nos jornais manchetes como:
“Jararaca bêbada atropela ciclistas em Porto Alegre”
“Cobra ciumenta inconformada com a separação mata suas filhas cobrinhas e se suicida em seguida para enlouquecer a companheira”
“Cobra enfurecida mata vizinho por estacionar na frente da sua toca”



Peguei um suporte de espeto da churrasqueira ao lado e dei para meu irmão cutucar a cobra até lançar-se ao rio. É impressionante a velocidade dela ao atravessar a corrente de água. Ela foi abrigar-se na outra margem, um pouco menos hostil.


segunda-feira, 7 de março de 2011

A noiva temida


Jornal Zero Hora - 1° de março de 2011

sábado, 5 de março de 2011

Lá se foram as férias


Pensei nessa peça para os que deixaram para trás as delícias das ondas do mar ou o frescor das cachoeiras e córregos das montanhas. O som das águas caindo me relaxa bastante. Quando criança passava as férias na casa da minha avó que era cercada de rios e canais que abasteciam uma pequena hidroelétrica familiar e movimentavam uma serraria. Na cozinha da enorme casa de madeira, uma torneira de bronze, meio emperrada, vertia a água fresca vinda de uma fonte do alto da colina. A torneira deixava passar um filete contínuo dia e noite embalando meu sono de criança. Ao ligar a fonte me vieram essas lembranças evocando os sons perdidos na inocência dos meus primeiros tempos.